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Porque só falam no Estado Novo e esquecem a 1º República?

A desonestidade intelectual é bem patente nas elites portuguesas que induzem o povo a pensar que o atraso de Portugal na época contemporânea se deve ao Estado Novo. Nada mais longe da realidade. Em boa verdade, o atraso de Portugal começou durante a vigência da primeira República. Mas, para sermos rigorosos, esse atraso começou na Revolução Liberal de 1820, quando o país começou a ficar à deriva. Mas se quisermos ainda mais rigor, teremos de recuar no tempo, até Alcácer-Quibir e à dinastia filipina que tomou conta dos destinos do país numa espécie de união Ibérica. Depois, a decadência acentuou-se, já depois da Restauração de 1640, com o ataque ao império ultramarino português e com a consequente perca de territórios. Chegamos então às invasões napoleónicas e à fuga do príncipe-regente e da família real, acompanhada das elites, para o Brasil. E eis-nos chegados à Revolução Liberal de 1820 e à independência do Brasil em 1822. Todos estes períodos foram marcados por inevitáveis decadências do país ao mesmo tempo que íamos perdendo poder, influência, investimento e dinheiro.



Mas reportemo-nos exclusivamente ao período da 1º República e deixemos os períodos anteriores para trás (em outro post falarei sobre isso). Mesmo com a agravante da Primeira Guerra Mundial, que não pode servir de desculpa para o péssimo desempenho dos sucessivos governos, a situação política, económica e social do país agravava-se continuamente. Portugal teve entre 1910 e 1926, 42 governos, alguns deles duraram apenas dias, a instabilidade e os apetites eram uma constante, ninguém se entendia, fazia-se uma Revolução por "dá cá aquela palha", os desentendimentos entre as elites económicas e a burguesia aumentavam de tom, toda a gente queria "poleiro" e as contas públicas portuguesas deterioraram-se rapidamente. 
No período entre 1914-1918, o défice orçamental, a persistência da inflação a níveis sempre altos e a depreciação monetária puseram em causa o normal funcionamento do Estado. O desequilíbrio entre as despesas e as receitas públicas originou um clima de desordem financeira favorável a movimentações dos interesses mais atingidos pela desvalorização  interna e externa do Escudo, que amiúde reclamavam políticas de austeridade nas finanças, às quais se juntaria o reforço autoritário do poder Estatal.

É revelador o conflito entre as elites económicas e as facções burguesas (quando se pensava que o conflito seria entre o proletariado e a burguesia), em Setembro de 1924, é criada a União dos Interesses Económicos, uma espécie de federação antidemocrática de associações patronais que seguiu uma estratégia «entrista» de superação do sistema, foi a votos e alcançou representação parlamentar para melhor defender os seus interesses. 

No campo económico, o movimento inflação-deflação desgasta as bases sociais da república parlamentar, aliena o apoio de grupos cada vez mais amplos do corpo de oficiais, inquieta e perturba o funcionalismo público e diversos estratos urbanos e rurais da pequena burguesia. A crise económica é parcialmente atenuada no governo de António Maria da Silva (1920), mas em 1922, logo a crise ganha novo alento e os interesses desacautelados da indústria, da agricultura e do comércio, mesmo com a revalorização do Escudo em 1924 no governo de Álvaro de Castro, começavam a conspirar contra a república desejando uma qualquer solução ordeira que aquietasse os seus interesses. O que se sempre se manifestou durante a 1º República, em especial, a partir de 1922, foi um profundo desajustamento entre o Estado Liberal e os movimentos sociais que seria , em parte, causa do fim da república e dos seus devaneios.


Mas vejamos os números ( unidade milhares de contos):

últimos anos da monarquia:
1906/1907 - despesa efectiva: 57/ receitas totais: 56/ saldo: -1
1907/1908 - despesa efectiva: 70/ receitas totais: 67/ saldo: -3
1908/1909 - despesas efectivas: 68/ receitas totais: 65/ saldo: -3
1909/1910 - despesas efectivas: 69/ receitas totais: 68/ saldo: -1

durante a 1º República:
1910/1911 - despesas efectivas: 63/ receitas totais: 65/ saldo:  2
1911/1912 - despesas efectivas: 64/ receitas totais: 61/ saldo: -3
1912/1913 - despesas efectivas: 76/ receitas totais: 79/ saldo:  3
1913/1914 - despesas efectivas: 62/ receitas totais: 69/ saldo:  7
1914/1915 - despesas efectivas: 95/ receitas totais: 68/ saldo: -27
1915/1916 - despesas efectivas: 134/ receitas totais:86/ saldo:-48 
1916/1917 - despesas efectivas: 144/ receitas totais: 89/ saldo:-56
1917/1918 - despesas efectivas: 179/ receitas totais: 92/ saldo:-87
1918/1919 - despesas efectivas: 271/ receitas totais: 101/ saldo:-170
1919/1920 - despesas efectivas: 347/ receitas totais: 159/ saldo: -188
1920/1921 - despesas efectivas: 418/ receitas totais: 219/ saldo: -199
1921/1922 - despesas efectivas: 550/ receitas totais: 320/ saldo: -230
1922/1923 - despesas efectivas: 1187/ receitas totais: 537/ saldo: -649
1923/1924 - despesas efectivas: 1171/ receitas totais: 770/ saldo: -401
1924/1925 - despesas efectivas: 1428/ receitas totais: 1162/ saldo: -266
1925/1926 - despesas efectivas: 1508/ receitas totais: 1099/ saldo: -409

depois da 1º República:
1926/1927 - despesa efectiva: 1821/ receitas totais: 1187/ saldo: -634
1927/1928 - despesa efectiva: 1667/ receitas totais: 1511/ saldo: -155
1928/1929 - despesa efectiva: 1757/ receitas totais: 2048/ saldo: 291
1929/1930 - despesa efectiva: 1862/ receitas totais: 1945/ saldo: 83
1930/1931 - despesa efectiva: 1730/ receitas totais: 1820/ saldo: 190
1931/1932 - despesa efectiva: 1845/ receitas totais: 1894/ saldo: 49
1932/1933 - despesa efectiva: 1931/ receitas totais: 1920/ saldo: -11
1933/1934 - despesa efectiva: 1973/ receitas totais: 1983/ saldo: 10
1934/1935 - despesa efectiva: 2879/ receitas totais: 3036/ saldo: 157

É preciso comentários?? Parece-me que não, os números não mentem falam por si.

Continua.







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