A partir de meados do século XVIII com a emergência da ciência moderna, o
homem descobre a possibilidade de manipulação da matéria. Substitui
assim o primado da contemplação desinteressada da natureza pelo primado
da acção concreta sobre a natureza com fins utilitaristas.
Segundo a expressão cartesiana, o homem torna-se «mestre e possuidor da natureza», herdeiro de um novo fogo "prometeano".
A liberdade passa a ser concebida em termos de potência e poder [de
manipulação da matéria], preâmbulo da era das grandes invenções. Quando
o eticismo humano se reduz à sua inexpressão, a liberdade destitui-se
da sua capacidade de amar e de consentir ao bem. A possibilidade do mal
passa a ser a condição do exercício da nossa liberdade e neste
contexto materialista e ausência de impedimentos exteriores, a
liberdade nada mais representa que um puro movimento de inércia humana. O
Maio de 68 representou o culminar da antropologia hobesiana e
spinoziana: "É proibido proibir" .
Paradoxalmente, ou talvez não, o determinismo físico ao qual se reduz a
concepção de liberdade [liberdade(s) negativa(s)] opõe-se ao exercício
propriamente dito de liberdade, que supõe com efeito um certo
indeterminismo da vontade.
O homem sendo livre, segundo os cânones modernos, não existe à "maneira
do mundo físico", a natureza humana não existe, o homem é apenas um
projecto. Evidentemente que o termo natureza se presta a várias
interpretações, por causa das suas diversas acepções que se tornaram
fonte de problemas e equívocos. A natureza humana não era muito evocada
no tempo da filosofia clássica, apenas se tentaram algumas aproximações
ontológicas relativas ao ser, mas nunca foi evocada em termos
científicos. A natureza era vista em termos qualitativos e não em termos
quantitativos.
No domínio ético a lei natural não se opõe à liberdade individual (é
ver a mentira dos nossos dias que afirma o contrário); ela não é uma lei
física que determina os comportamentos, mas sim uma lei moral que serve
sobretudo para disciplinar as nossas consciências. Neste plano a
liberdade é considerada como uma condição da responsabilidade, uma
capacidade de síntese entre as exigências humanas e a recta razão, para
assim se poder criar um «bem propriamente humano».
Inexistente ou impenetrável, privada de consistência ontológica, a natureza deixou de ser vista pelos modernos um
princípio de determinação ética. O racionalismo dos nossos dias proíbe
toda a perspectiva qualitativa da natureza: o homem apenas se representa
tendo em conta a matéria e o número, em suma, a quantidade sempre em detrimento da qualidade.
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