A historiografia portuguesa tem dificuldade em lidar com a verdade. Bem sei que a missão de qualquer historiador que se preze é divulgar a história tal como ela foi e não fazer juízos de valor ou julgamentos morais. Claro que este exercício nem sempre é fácil, abundam falsificações históricas e as fontes, por vezes, não são fidedignas. Cabe assim ao historiador "separar o trigo do joio", mas há momentos em que os julgamentos morais são necessários. Diria mais, são imperiosamente necessários em virtude da falsidade que circula por aí, por exemplo, sobre a figura sinistra do marquês de Pombal.
Os falsos mitos sobre Pombal:
Sobre o marquês, diga-se que ele estudou Direito em Coimbra mas não acabou a licenciatura. Está visto, era um cábula. Serviu no exército mas pouco tempo lá esteve - não era para ele - segundo o próprio. Foi para Londres, ainda no tempo de D. João V, como diplomata do Estado português durante sete anos e não aprendeu uma única palavra de inglês. O que não deixa de ser um contra-senso e nada abonatório para a sua figura. Subiu ao poder pela cunha, metida pela sua esposa austríaca depois de se ter tornada amiga da esposa do rei D. José, também austríaca. Em matéria de legislação e de administração nada fez de notável, pois a jurisdição, as leis que regularam e permitiram a difusão de Companhias e de indústrias, o fim da distinção entre cristãos novos e cristãos velhos, já vinham de trás, do tempo de Alexandre Gusmão, secretário de D. João V.
Aboliu a escravatura com o único propósito de obrigar as grandes casas senhoriais a pagar salários aos escravos. Pombal tinha uma espécie de complexo de inferioridade por ser originário da baixa-nobreza - quanto aos seus escravos, o erário público é que lhes pagava -, não acabou com a escravatura por motivos humanitários, mas sim, para se aproveitar da situação. Acabou com a inquisição mas criou a Real Mesa Censória em 1768, com poderes ainda mais ditatoriais do que o Tribunal do Santo Ofício; enviava tropas a casa das pessoas para inspeccionar se tinham obras proibidas - grande democrata (!!) - na defesa dos ideias iluministas em voga na Europa da época.
Os portugueses não podiam ler ou pensar. Defendia que as localidades que não tivessem pelo menos 200 fogos não poderiam ter escolas, nem que a sua frequência fosse paga. Os jesuítas ofereciam ensino e formação de graça, mas foram expulsos e considerados os maus da fita.
Mais falsos mitos - o reformador:
A sua tão badalada reforma educacional (uma mentira, tão a gosto de certos sectores...) consistiu em destruir o que existia em todos os níveis de ensino, tudo criação dos jesuítas que foram pioneiros na difusão do ensino em Portugal. Eliminou a concorrência do ensino jesuíta substituindo-o por um monopólio de paupérrima qualidade, obliterando por completo o sistema que preparava os alunos para o ensino superior, que até aí, antes da chegada do facínora, era assegurado de graça pelos jesuítas.
É sabido que Pombal cobiçava os bens dos jesuítas, tinha-lhes imensa inveja, não suportava o contraditório e para colocar em marcha a sua ditadura iluminista necessitava de afastá-los. De 1750 a 1777, os jesuítas foram implacavelmente perseguidos, caluniados e os seus bens confiscados. [num outro post falarei com mais detalhe na questão do envolvimento na tentativa de regicídio e no desrespeito das fronteiras na América do Sul]
Enquanto que a Europa mais desenvolvida criou a instrução estatal para induzir uma determinada interpretação da Bíblia, segundo as respectivas seitas protestantes (calvinistas, anglicanos, luteranos, etc.) em oposição à igreja católica, em Portugal os jesuítas detinham uma rede de colégios com cobertura nacional, incluindo as principais cidades do Brasil, casos de Rio de Janeiro, S. Paulo e Salvador, de enorme qualidade reconhecida internacionalmente com uma constante actualização e substituição do corpo docente, sempre que necessário. O Édito de expulsão dos jesuítas, preparado e forjado pela besta do marquês de Pombal, provocou o fim dos colégios, da Universidade de Évora, dos professores e de perto de 20000 alunos do ensino preparatório e secundário.
Para se ter uma ideia deste desastre, vejam-se os seguintes números: de 1724 a 1772, imediatamente antes da reforma do facínora, a Universidade de Coimbra tinha uma média anual de 2800 alunos, depois da reforma do filho da p..., de 1772 a 1820, a média baixou para 451 alunos, ou seja, uma redução de quase 85%. E ainda há quem teça loas a este filho de uma grande p.... mas vamos a outro exemplo; no curso de matemáticas no ano seguinte à reforma pombalina (1773) matricularam-se 8 alunos, um faleceu e outro desistiu, em 1774 apenas 2 matrículas mas só um deles seguiu o curso, nos anos seguintes, 1775, 1776 e 1777, não houve matrículas. Grande reforma do ensino, sem dúvida!!!
Poderia dar mais exemplos de outros cursos, mas não vale a pena, os números são mais ou menos desastrosos como este exemplo já citado. O ensino e tudo de bom feito pelos jesuítas foi destruído e, em 1850, 85 % da população portuguesa era analfabeta. Na Escócia, na Suiça, na Alemanha e na Holanda, o analfabetismo andava pelos 8 a 5 %.
Só 170 anos depois, isto é, em 2018, Portugal atingia 95 % de alfabetização da população (embora por cá existam muitos analfabetos funcionais..). Deste modo, não surpreende a divergência económica do país no século XIX com o resto da Europa, era inevitável!
Com 27 anos de ditadura e de desvario social, económico, cultural e educacional, com o maior filho da puta da nossa história contemporânea, nunca tivemos, e ainda não temos, apreço à liberdade, quando um tirano desta envergadura é branqueado pela maioria do nosso escol, em particular, professores e historiadores.
Não é de estranhar que continuemos pobres, na cauda da Europa e endividados: sem liberdade não há prosperidade, tudo graças à GRANDE BESTA do marquês de Pombal que acusou os jesuítas de serem os responsáveis pelo atraso de Portugal a nível educativo e formativo, quando na realidade foi o contrário. Mas ainda continua a haver, e insisto neste ponto, quem teça loas ao MAIOR FACÍNORA DA HISTÓRIA CONTEMPORÂNEA PORTUGUESA.
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