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A herança filosófica da esquerda e da direita

 

Ser conservador hoje é sobretudo reconhecer uma ordem natural das coisas que o homem não pode modificar sem causar grandes destruições. Sejam elas materiais ou espirituais. Mas ser-se conservador é mais do que simplesmente o acima dito, é a compreensão clara que a tradição tem um papel muito importante para qualquer aspiração de progresso. Tal como assistimos hoje, o homem, sendo autor de uma "ordem artificial" pode modificá-la mediante a evolução dos acontecimentos. A intuição de um conservador consegue perceber a existência de uma ordem natural da qual o homem não é o autor, mas o mesmo é inevitavelmente participante nessa ordem, podendo modificá-la e moldá-la.
Todos aqueles que não percebem ou intuem esta ordem, foram de diversas formas "formatados" pela ideologia do contrato social, que rejeitava pura e simplesmente a natureza política do homem, considerando a sociedade como uma convenção puramente humana. É provável que esta ideologia desconstructiva do Ancien Regime se destinaria sobretudo ao rei, último bastião contra as abstracções filosóficas de 1789, mas a mesma não deixou de ferir de morte as pátrias e os impérios tornando-se estas apenas ideologias ou concepções humanas sem valor. As arbitrariedades de um poder político que, tendo "despejado" a noção tradicional do homem e da natureza, rejeitava igualmente qualquer tentativa de garantir os valores em face de uma "vontade geral" classificada como inevitável. O primeiro passo para garantir a "vontade geral" tinha sido dado por Maquiavel quando o mesmo ajudou a emancipar a política da moral, depois dele Rousseau dá o passo definitivo, emancipando a política do homem.
 
Um indivíduo de esquerda pode hoje ser classificado, incluindo-se aí os neoliberais e os liberais de direita, de negador da ordem natural. O conceito de evolução permanente, à boa maneira de Heraclito, imagina um mundo onde o homem e a sociedade têm papel importante, mas que está sempre em mudança, o contínuo devir; sendo assim a ordem não é ditada pela natureza, passando a ser puramente contingente perante a arbitrariedade humana. Também este conceito teve o contributo de Ockham que já na sua época dizia: «Neste mundo caótico e atomizado, desprovido de sentido, toda a regra procede necessariamente de um acto voluntário».
 
Esta tentativa medieval de subjectivização de todos os parâmetros da vida humana, permitiu que o homem se convencesse que era capaz de perceber a essência das coisas, penetrando na "estrutura ontológica" do real. De seguida, postula-se uma ruptura definitiva entre o real e o ideal, que dará nascimento aos diversos socialismos e liberalismos que inundaram o século XIX, cujos efeitos se manifestaram em pleno no século XX e continuam a fazer estragos nos inícios do século XXI.

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