Ao contrário do que a história (uma certa história) quer fazer crer, a Rússia sempre foi um país atrasado até ao século XX e esse atraso tem um culpado: Pedro O Grande. Ele grande era sem dúvida, mas só de tamanho, media mais de dois metros de altura..
É um facto que o czar Pedro fez um esforço notável para reforçar a base económica da Rússia, mas nunca tendo em conta a melhoria das condições de vida do seu povo infeliz e oprimido. Só pensava no bem do Estado, o único motivo que o impelia a elevar o nível económico do país. O solo russo tinha condições para produzir e oferecer maiores lucros, desde que se utilizassem métodos mais racionais e se aumentasse de modo compensatório o esforço dos camponeses, mas estes últimos não retiravam qualquer vantagem de mais esforço e trabalho, bem pelo contrário.
Os milhões de mujiques (camponeses russos pobres, pré-1917) que se matavam à força de trabalho não levavam uma vida compatível com a dignidade humana, eram animais de carga. Tudo o que poderia ter criado mais bem-estar, ou pelo menos, condições de vida mais suportáveis, era imediatamente engolido pela máquina de guerra do czar que espremia o seu povo como quem espreme um limão.
Extorquia o máximo de dinheiro possível por meio de impostos directos e indirectos, o que fez com que muitos russos fossem reduzidos à mendicidade e provocando a fuga de muitos outros. É revelador um recenseamento do ano 1710 que demonstrou que o número de contribuintes diminuiu em um terço durante os primeiros dez anos de guerra, quer devido ao recrutamento para o exército, quer devido à fome e às fugas. Em algumas regiões essa proporção andava próxima dos 50%.
O grande facto é que o povo russo preferia saciar a sua fome a ter canhões, espingardas e grandes exércitos, mas Pedro não conseguia alcançar isto de tão absorvido que estava nas guerras para conseguir saídas para o Báltico e o Mar Negro. Além disso, o czar não sabia e nem queria insuflar o sentimento da responsabilidade e da honra. Tudo na Rússia se operava à força, pela coacção e pela ameaça. Não era, evidentemente, o melhor modo de se cultivar o sentimento do dever na mais alta acepção da palavra. Mas diga-se também, e em abono da verdade, que o czar tinha de lidar e manejar um povo extraordinariamente amorfo e sem sentimentos muito elevados, que se considerava e julgava bem como estava e que não via necessidade de ser melhor ou elevar-se relativamente aos seus antepassados. Para além da imensidão do território russo, com necessidades e prioridades muito diferentes de local para local. Também é certo que Pedro sempre viveu e reinou no meio de grande hostilidade, quer do povo, quer das elites religiosas que não viam com bons olhos as suas pretensas reformas que mexiam directamente com os interesses de muitos mosteiros russos.
Pedro não teve pejo em sacrificar o seu filho Aléxis, fruto do seu primeiro casamento com Eudóxia, para conseguir os seus intentos. Pedro e Aléxis nunca se deram bem e chegou o dia em que Aléxis fugiu para o estrangeiro farto das prepotências e das agressões do pai. Pedro Tolstoi foi encarregue pelo czar de procurar e convencer o filho a regressar à Rússia e assim o fez. De regresso ao país, Aléxis foi preso e torturado e logo de seguida condenado à morte.
Um pai que condena um filho à morte, mesmo considerando a época (ainda muito bárbara na Rússia) e os contextos muito específicos da altura, não deixa de ser uma besta e não um pai. [mas é só analisar bem, apesar das razões que lhe possam assistir, o que está fazer Putin, matando e condenando muitos russos e ucranianos que não deixam de ser irmãos, à morte e à miséria moral e psíquica].
Apesar do atraso considerável da Rússia (a imensidão do território e a multiplicidade étnica sempre foram um factor de desunião e dificuldades) reconheça-se que Pedro conseguiu ligar as duas metades da Europa, a Ocidental e a Oriental, que até aí estiveram sempre separadas e de costas voltadas fazendo com que os eslavos participassem cada vez mais na vida da Europa. Apesar do atraso e da falta de tacto político e psicológico de Pedro, honra lhe seja feita por este último facto, a união do Ocidente e do Oriente europeus.
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