Passados poucos anos do século XXI deparamo-nos com uma situação atípica: um pouco por todo o lado começam a abundar a contestação aos resultados eleitorais. Esta contestação tem consequências gravosas para a própria saúde da democracia, reflectindo-se quer nas questões estruturais, quer na própria vitalidade da democracia propriamente dita.
Quando as constituições permitem que um partido que não venceu as eleições, como aconteceu em Portugal no ano de 2015, passe a governar mediante soluções anti-naturais como o caso da célebre geringonça, a definição de democracia está posta em causa. Uma coligação contra-natura, quase sempre não anunciada nas campanhas eleitorais, serve apenas para conseguir ou manter o poder a todo o custo. E como bem sabemos isso não é democracia, bem longe disso.
Começam a ser recorrentes os fenómenos de recusa dos resultados eleitorais, seja com o argumento de fraudes, seja até pela recusa do reconhecimento dos órgãos executivos eleitos, cujo direito e consequente dever de governar é negado. Daqui se seguem as conflitualidades, as guerrilhas nas ruas e nos gabinetes, com maior prejuízo para quem dá, ou deveria, dar corpo à democracia, ou seja, os cidadãos. Muito naturalmente fruto de um processo institucional duvidoso, as divergências já não são sanadas pela orgânica democrática, mas sim por grupos de pressão, quer nas ruas, quer nas redes.
Em Portugal esta realidade ainda não é visível e patente, mas para lá pode caminhar. Para mais quando existe um padrão já bem definido, um plano inclinado, no qual todos cairemos a curto-médio prazo se nada for feito. Falo claramente do colapso das democracias. E as próximas legislativas de 10 de março podem ser o início da tendência em Portugal, perante a quase certa ausência de maiorias e a cada vez maior fragmentação ideológica, não apenas entre eleitos e eleitores (incluindo aqui os abstencionistas) mas também entre esquerda e direita com os grupelhos associados que já não se sabe muito bem o que são.
Assacar culpas a este fenómeno não é tarefa simples. Se por um lado é certo que a crescente descaracterização, decadência e descrédito da intermediação mediática profissional e institucional (o jornalismo), acoplada à descontrolada intermediação das redes sociais, têm culpas no cartório, por outro lado, compreende-se muito mal que numa era em que o nível de doutrinação democrática é muito alto, tal como a suposta formação das pessoas em geral, possibilite este estado de coisas. Claro que, e isto é uma evidência mais do que evidente, as contestações dos resultados eleitorais são muito mais manifestas entre a esquerda do que entre a direita. Mas ainda há outra questão a baralhar este fenómeno; a superficialidade com que tudo é tratado (exceptuando o futebol, desporto de massas) a que se segue a geral ignorância dos fundamentos teóricos, históricos, filosóficos e doutrinais subjacentes a todos os temas tratados de forma tão leviana. Poderemos aqui justificar, em parte, esta ignorância com a vida frenética que levamos, o que não permite a devida análise e explanação de que os temas carecem.
Para além das causas já aqui apontadas podemos também culpar as instituições, a democracia e os seus órgãos representativos pouco evoluíram e mudaram desde meados do século XX. Na verdade a democracia coarcta as nossas liberdades, controla muitos e muitos aspectos da nossa vida e da sociedade em geral, asfixia-nos com leis e decretos de leis que não servem o povo nem sequer podem ser considerados democráticos. Não esqueçamos que na maioria das democracias, a representação parlamentar e/ou presidencial, tal como a questão abstencionista, devido às obsoletas regras e métodos eleitorais, faz com que as "maiorias governamentais" que decidem sobre 90% da nossa vida não representam mais do que 30% da população. Esta é uma evidência da qual ninguém (poder político) quer saber, tal como o facto de o método de Hondt que vigora no sistema eleitoral português estar completamente desfasado da realidade actual. Um voto em Lisboa, ou nas maiores cidades de Portugal vale mais do que 100 votos em outros locais de menor dimensão e população. Ora, isto não é democracia, é uma fraude; um voto é um voto, seja em Lisboa, no Porto, em Boliqueime, em Freixo de Espada à Cinta ou em Mondim.
Esta propensão democrática de tudo querer controlar e fazer depender da vontade do Estado provoca, inevitavelmente, o desinteresse generalizado, a asfixia e a arbitrariedade, o que aumenta o nível de contestação e a não aceitação dos resultados eleitorais que terão impactos muito decisivos e até injustificados sobre a vida das pessoas. Ninguém duvida hoje que foi a esquerda que aumentou o mais possível o nível das funções do estado, a ingerência sobre os assuntos sociais, sabendo-se que a mesma quer um Estado máximo criador de paternalismos acéfalos e criador, claro está, de toda esta situação que temos vindo a debater. Como já o afirmei mais acima, não deixa de ser curioso o facto de a esquerda ser quase sempre a contestatária dos resultados eleitorais sempre que não consegue vencer. E temos exemplos muito recentes, penso que não é necessário recordá-los. A definição ideológica da esquerda, cheia de incoerências e impossibilidades pretendendo um Estado omnipotente, omnipresente e permanentemente interventivo, a isso leva, mas também, por saber o potencial do Estado para controlar as pessoas receando que a direita, sempre que chegue ao poder, possa fazer sempre que não seja tolhida por uma constituição de esquerda. Claro que em Portugal a constituição está mais do que tolhida pela esquerda, imperioso se mostra modificá-la e acabar com esse tolhimento.
Quando a direita chega ao poder bem tenta, de diversas formas, baixar as interferências estatais, mas esbarram sempre na falta de maioria para revisões constitucionais, pois a esquerda nega essa veleidade sabedora de que a sua única possibilidade de chegar e estar no poder é precisamente pela via do Estado máximo, castrador da livre iniciativa, inibidor das liberdades e aprisionador das vontades dos cidadãos, em suma, a esquerda quer os populações debaixo "das asas do Estado" para de modo dissimulado tudo controlar e a todos nos manter inibidos. Isto tem muito que se lhe diga e as pessoas não se apercebem, ou apercebem-se tardiamente, que o facto do Estado querer ser alternativas e o único decisor, forçando o comportamento obrigatório de todos, cria precedentes nocivos à vida em sociedade. Vejam-se as subsidiodependências, os parasitismos que garantem votos (à esquerda), as falsas perspectivas de vida incutidas às populações que visam uma igualdade falsa, a não valorização individual (meritocracia) e consequente exaltação da sociedade em detrimento do indivíduo...
O código legislativo esmaga as populações, tantas são as leis, muitas delas sem efeitos práticos visíveis, de modo algum as leis são gerais, práticas e claras. Todas as pessoas deveriam saber institivamente e sem demasiado esforço, o que é ou não legal, o que se deve ou não fazer, mesmo considerando que o desconhecimento das leis não desobriga quem quer que seja. Mas nada disso acontece perante o pandemónio legislativo e regulatório existente em Portugal. Não é raro a mesma acção ter decisões diferentes e até mesmo antagónicas nas mesmas instâncias em comarcas diferentes.
A direita, a verdadeira e não a travestida de tal, terá um papel crucial num futuro próximo: recentrar a democracia e libertar os cidadãos do peso esmagador do Estado, mediante a carga fiscal absurda praticada e esta libertação é transversal a várias áreas, desde a economia, ao ensino, à justiça, à saúde e à Segurança Social.
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