Avançar para o conteúdo principal

Igualitarismos - as sucessivas revoltas contra o mundo ordenado

«Por mais de um século, tem-se associado geralmente à esquerda a Moralidade, a Justiça e o "idealismo"; a oposição conservadora da esquerda foi em grande parte confinada à inviabilidade dos seus ideais. Por exemplo, uma ideia comum é a de que o Socialismo é esplêndido "na teoria", mas que "não funciona" na vida prática. O que os conservadores não foram capazes de perceber foi que, se na verdade, a curto prazo, alguns ganhos podem ser conquistados ao apelar para a inviabilidade de abordagens radicais, ao entregarem a ética e o "ideal" à esquerda eles estariam condenados à derrota a longo prazo».

In Igualitarismo - Revolta Contra a Natureza de Murray N. Rothbard, pp. 15 e seguintes.


O que se pode deduzir aqui deste pequeno trecho é que efectivamente a esquerda [mundial] tomou conta dos destinos da ética e dos ideais como ferramentas maleáveis, que podem ser adaptadas e sofrer contínuas reestruturações até conseguirem o que pretendem. É isto mesmo que afirma Rothbard quando diz que: «Se a um dos lados forem concedidos, desde o início, a Ética e o "ideal", esse lado será capaz de efectuar mudanças graduais mas seguras na sua própria direcção, e como essas alterações se acumulam, o estigma da "inviabilidade" torna-se cada vez menos relevante».

Insisto aqui neste ponto: (...) como essas alterações se acumulam, o estigma da "inviabilidade" torna-se cada vez menos relevante. 

A capacidade que a esquerda ganhou, ao tomar de assalto a ética e o ideal, muito mais do que uma ideia e uma crença, mas uma inevitabilidade [o acreditar no futuro, num certo futuro, mais do que certo...], possibilita tudo. As sucessivas mudanças de que fala Rothbard são o ponto chave para toda esta dinâmica; o aprimorar da ética ao serviço de causas redefine o conceito de ideal, não mais como algo passível de flutuações e acertos, mas como algo de estruturalmente monolítico e estável na sua própria natureza. Já não interessa mais se determinada ideologia servida por certa ética, inventada ou deturpada, é ou não viável. O que interessa é a crença na possibilidade de tudo poder ser afinado e acertado mediante passos seguros e persistentes.  Rothbard sintetiza esta questão de forma primordial quando diz o seguinte: «A oposição conservadora, tendo apostado tudo na base do que é sólido e "prático" (ou seja, o status quo) está condenada a perder à medida que esse status quo se vai deslocando para a esquerda».

Tudo isto a propósito da igualdade, termo hoje erigido a altar das divagações dos novos crentes dos «amanhãs que cantam», ou «do paraíso na terra».

Rothbard é evidentemente desafiador e não se coíbe de criticar o ideal igualitário em si. Pergunta ele, no seu livro, se deve a igualdade beneficiar o seu status actual como um ideal ético inquestionável. De modo claro e certeiro, e antes de responder, faz notar que é preciso desafiar a ideia de separação radical entre algo que é "verdadeiro em teoria" mas "inválido na prática". Se a teoria estiver correcta, então funciona na prática; caso não funcione é uma má teoria. Rothbard faz notar ainda que a separação comum entre teoria e prática é artificial e falaciosa, sendo isto válido tanto para a ética, como para outros campos.

O que Rothbard pretende aqui expor e dizer, de modo claro e sucinto, é que se um qualquer objectivo ético (neste caso, a igualdade) viola a natureza do homem e/ou do mundo, não podendo funcionar na prática, então a teoria que suporta a igualdade está manifestamente errada!! Conclui Rothbard que trabalhar em prol desse objectivo, sabendo-se que ele não funcionará na prática, é uma péssima ideia.

Não é por acaso que ele diz que o igualitarismo foi, e é ainda, tratado de forma acrítica e axiomaticamente como um ideal ético. A esquerda considera e torna a vida em sociedade miserável ao pretender que uma impossibilidade seja possível, porque essencialmente todos somos negligentes ou pecadores por não querermos atingir o "ideal ético" da igualdade. Mas na verdade o pecado começa no Estado ao institucionalizar a inveja, porque com efeito, a igualdade não passa de uma ficção de terror onde as implicações lógicas de um mundo igualitário assemelhar-se-iam a um mundo de criaturas idênticas e sem rosto, onde a ausência da individualidade, característica intrínseca de qualquer ser humano, potenciaria o fim da variedade ou da criatividade especial. Para quem tanto apregoa a diversidade de culturas, de mundividências ou de realizações culturais, isto é um contra senso flagrante, é uma contradição em termos chocante.



Comentários

Mensagens populares deste blogue

O marquês de Pombal, o analfabetismo, o atentado a D. José e a fraude pandémica

O atraso de Portugal, quer a nível económico, quer a nível social ou a nível cultural, começa em meados do século XVIII. Passada a fase de grande prosperidade com D. João V e a chegada ao poder de D. José I, a liberdade e a alfabetização de Portugal sofreram um grande retrocesso. Esta tendência "suicida" de destruir o bom que já vinha de trás é paradigmática do processo de involução que este país tem vindo a sofrer desde há pelo menos 300 anos. A fase de fraude pandémica é apenas o corolário lógico de um acumular de farsas e mentiras. Quando os factos são conhecidos, não há surpresa quanto ao atraso de Portugal relativamente à Europa civilizada.  O nosso atraso nada tem a ver com a religião católica como de modo totalmente leviano e com uma boa dose de ignorância se afirma nos livros de história, tese partilhada e difundida por muitos historiadores. O nosso atraso começa com um dos maiores crápulas da nossa história, precisamente, o marquês de Pombal. Afirmar que os país...

Os 99 graus da maçonaria.

 Tudo é mistério, mistério que nada tem de misterioso. Tudo é oculto, ocultismo que brilha intensamente. Brilho não declarado, que escurece até a mais alva luz. Tudo é luz, na escuridão e na penumbra. Peidos e água fresca  para um homem muito moderno [o homem aqui é a sociedade burrocratizada], que se acha nos confins das auroras modernistas. Vivem na ilusão, muito contentes e ciosos de si, convencidos do paternalismo daqueles que nos querem destruir a prazo. Um tolinho que eu sou, conspiracionista e negacionista, de mangas largas e costas quentes.

Imaginemos que por momentos...

 O multiculturalismo foi a causa, uma das causas, da queda da Roma Imperial e vai ser a causa da queda da Europa. O multiculturalismo é prejudicial não apenas para os nacionais como também para todas as etnias não nacionais que coabitem nos mesmos espaços. Ninguém, poder político, quer saber disso para alguma coisa. Isto de enfiar pelas portas adentro gente alógena sem controlo, sem regras e sem restrições de qualquer espécie vai dar barraca. Já está a dar desde há uns tempos a esta parte. O português comum sabe bem disso e intui na perfeição o problema, mas enquanto se agitarem continuamente as bandeiras do racismo e da xenofobia, nada acontecerá para obstar a este estado de coisas. Os últimos acontecimentos na Amadora são o reflexo disto mesmo. Mais um de entre tantos outros. E claro, as desgraçadas das forças de segurança é que são culpadas. Mas imaginemos que por momentos as forças de segurança, as suas chefias, digam BASTA!! A partir de agora nós não iremos acudir nem iremos m...