O termo utopia origina-se, como é mais ou menos sabido, do romance de Thomas More aí pelos anos 1515. No seu entendimento (enviesado ou não, isso agora não interessa para aqui...) significaria «um bom lugar», mas também poderia significar «em parte alguma». More queria com a sua ideia de utopia estabelecer uma suposta comunidade ideal num local distante, isolado, e até mesmo inacessível à maioria das pessoas.
Este romance influenciou gerações de pensadores, de filósofos e políticos, de tal modo que, em muitas culturas e ao longo de uma boa parte da história, a sociedade tem sido "massacrada" pela ideia (equivocada) de uma sociedade perfeita interpretada como uma recordação de um paraíso perdido. O anacronismo bem patente nesta interpretação é precisamente a inatingibilidade dos tempos passados, em vez de um vislumbre de um futuro possível e atingível.
Não deixa de ser curioso o facto de Platão colocar a sua república ideal numa Idade do Ouro antes da história. Algo semelhante aconteceu há duzentos anos e mais atrás, quando se imaginavam as sociedades perfeitas situadas num passado irrecuperável ou em locais desconhecidos não registados em nenhum atlas ou mapa.
É igualmente digno de realce o facto de nem sempre o termo Utopia, segundo os seus apologistas, ter tido uma conotação revolucionária ou ter sido uma ideia abertamente política; isso apenas aconteceu mais tarde, na nossa actual época. Mesmo quando se diz que a ideia basilar da utopia é reformar a sociedade, nada tendo a ver com qualquer ideal revolucionário, tal premissa é manifestamente falsa. Basta ver que muitos utópicos dos nossos dias dizem não pretender derrubar a sociedade, mas tão só criar uma comunidade ideal que toda e qualquer sociedade possa usar como modelo. Mas esta tentativa de reformular o mundo, foi, na sua génese, um movimento de retirada do mundo, um escape à realidade efectiva e como essa retirada do mundo era impossível, a utopia passou a basear-se na tentativa de reformulação do mundo PELA FORÇA.
O sonho de harmonia final a ser estabelecido pela Utopia é, afinal, A GRANDE RECUSA, que politicamente e socialmente se reveste de aspirações que vão contra as verdadeiras necessidades humanas. As utopias são sonhos de libertação colectiva que não passam de pesadelos. Quem tiver dois olhos de testa depressa chega à conclusão que os projectos utópicos são, por natureza, irrealizáveis.
Já o dizia Hume: «Todos os planos de governo que pressupõem grandes reformas dos costumes da espécie humana são claramente fantasiosos».
Os utópicos de plantão, os que definham intelectualmente pela mente revolucionária, consideram, por exemplo, que as consequências desastrosas dos projectos utópicos da Rússia soviética e da China maoísta não tiveram a ver com os projectos em si, mas sim, a culpa foi das tradições russas ou chinesas. Quando o uso de métodos desumanos é o meio preferencial para qualquer fim, a Utopia, nada nem ninguém pode fazer face à verdadeira essência da utopia. E isto foi, e é ainda, bem visível.
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